sexta-feira, 29 de maio de 2020

Um achado


São Paulo, 31 de maio de 1929. 

Memórias pósthumas!... Título curioso, estranhável mesmo. Morrer para depois escrever memórias!... Tal cousa só podia nascer mesmo da imaginação de M. de Assis.
O seu Braz Cubas, embora tendo iniciado a nova vida que começava atraz da lagem do seu túmulo, não preferiu escrever a memória da sua vida entre os espíritos impalpáveis. Não, preferiu antes rememorar as cousas e factos deste mundo real. E não foi mau o gosto seu. Louvo-lhe a escolha. Fez o que todos nós fazemos com mais ou menos tempo. Somente divergiu um pouco por ter escrito as suas memórias. Outros, muitos outros, não vão tão adiante. Limitam-se somente a ter memórias. 
Não as deixam transparecer nítidas sobre o papel branco. Mas têm-nas gravadas no coração. E ali, não raro, uma página mais viva se salienta, um sucesso que para outros seria banal, uma data passada para muitos seu silêncio se evidencia com rigor e é recordada com insistência. 
Por ora, só uma data nos interessa. Bem sabes qual seja: o último dia do quinto mez do anno, o último dia do mez de maio. É uma rosa a mais que se abre com a innocente intenção de minorar a insipidez do universo entrante. 
Que se repita por muitas vezes e seja também o motivo de saudosas memórias.

                                                                                                                                          do Mario. 

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