-- E como estamos quase na fronteira, diga-me, amigo, o que pensa da França?
-- Penso que tem os melhores perfumes do mundo, mas não gosto de perfume engarrafado. Penso que a sua cozinha é requintada e ilimitada, mas eu prefiro comidas simples, como ovo estalado. Penso que guarda o segrego dos vinhos fabulosos, mas o que eu aprecio mesmo é água. Água somente. Penso que tem costureiros famosos, mas não sou otário. Penso que é ótimo o seu teatro, mas prefiro o inglês. Penso que são lindas e picantes as canções bulevardianas, mas não há nada no mundo igual ao jazz! Penso que sua vida mundana é um paraíso de elegância, mas meus hábitos são menos "fesandês". Penso que sua vida espiritual é intensíssima, mas me acomodo melhor com o asseio corporal. Penso que tem mulheres lindíssimas, mas eis um assunto sobre o qual não admito nenhuma preferência de origem. Penso que seu passado guerreiro é uma apoteose, mas eu sou inimigo dos canhões. Penso que Renard é minha bússola, mas que novos ventos perturbam a minha rota. Penso muita coisa, enfim, mas são segredos que irão comigo para o túmulo.
* Menton é uma localidade francesa situada quase na fronteira italiana, a meio caminho da cidade italiana de Ventimiglia e o principado do Mônaco. A crônica acima integra um conjunto de outras crônicas publicadas por Marques Rebelo no jornal vespertino "Última Hora", do Rio de Janeiro, entre 1951/52 e que aqui foram reunidas em livro pela José Olympio Editora sob o título de "Correio Europeu", 2º edição, Rio de Janeiro, 2014 e constituem um conjunto de impressões de viagens que o autor fez à Europa do pós-guerra.
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